02/06/2009

O Vestibular do MEC


Entendendo a polêmica

Nesses últimos meses, o que mais tem se ouvido é que o vestibular vai acabar.

No meu ponto de vista, acho inviável que isso ocorra. É preciso entender que quanto mais avançado o país, mais competitivo é o acesso às boas escolas, pois passam a ser mais decisivas no futuro do candidato. Na passagem do ensino médio para o universitário, há um “gargalo”, mesmo nos países mais ricos. Como há mais candidatos do que vagas, como decidir? Provas ou sorteios? Melhor escolher os alunos mais bem preparados.

Com isso, não há o “fim do vestibular” por uma razão - o total de vagas nas escolas superiores oficiais é, em média, 7 vezes inferior ao total de candidatos.

Vejamos como essa passagem é feita em outros países:

Japão - Enorme concorrência para entrar nas melhores escolas. Todos fazem curso, desde o jardim de infância.

Coréia - Os pais gastam tanto nos cursos quanto o estado em educação pública.

Estados Unidos - Em cada estado há instituições públicas obrigadas a aceitar qualquer aluno. Contudo, no topo da pirâmide, nas melhores universidades, a competição é elevadíssima, mais árdua que no Brasil. Logo, mais vagas não resultam na eliminação de concorrência.

A avaliação americana, em linhas gerais, é um teste composto por questões de múltipla escolha e dissertativas, dividido em três seções: leitura crítica, matemática e redação. Cada seção tem uma escala de pontuação de 200 a 800.

Há ainda, os SAT Subject Tests, que avaliam o conhecimento do estudante em relação a uma determinada disciplina acadêmica (existem 20, no total, como francês, química e história geral). A prova é tão importante por lá que virou até tema de filme, em 2004. Em “The perfect score”, estudantes tentam roubar as questões do exame.

O SAT é aplicado sete vezes por ano. Além disso, a nota nessa avaliação é apenas uma entre as muitas informações que os “colleges” e universidades levam em conta na hora de selecionar os candidatos. Há uma análise de outras informações, como atividades acadêmicas realizadas pelo aluno, cartas de recomendação escritas por seus professores, histórico escolar etc.

França e Argentina - todos os que têm Ensino Médio entram na faculdade, mas, no primeiro ano, metade é incluída. Vejamos cada país de foram isolada:

• Argentina - Não há vestibular. Antes da universidade há um curso - o Ciclo Básico Comum - realizado dentro dos próprios colégios. Os mais bem avaliados têm preferência na opção pelas faculdades.

• França - Não há vestibular ou curso. Os alunos prestam um exame chamado Baccalauréat (Bac). Basta atingir a média exigida para garantir lugar na universidade.


A nova proposta do MEC

Na minha concepção, o vestibular não é um exame ruim. Os grandes concursos das melhores universidades do país se prestam bem à sua finalidade básica, a de colocar na sala de aula os alunos mais aptos.

A recente proposta do MEC, principalmente voltada às universidades federais, para unificar os exames vestibulares por meio de um novo exame geral, tem produzido reações confusas e mal-entendidos.

Os vestibulares, que envolvem mais de um milhão de pessoas no país a cada ano, com o poder de decidir quais serão escolhidos para ocupar um reduzido número de vagas nas universidades públicas, despertam sentimentos fortes. Tão fortes que acabam prejudicando a percepção de que um exame nacional unificado, como o proposto pelo MEC, ainda é um exame vestibular; por sinal, o maior de todos. Unificar os exames federais de forma alguma indicará o fim do vestibular.

A nova proposta é mudar o ENEM para utilizá-lo como vestibular nacional.

Essa proposta não põe nada de pernas para o ar. Trata-se de um grande vestibular com 180 questões e uma redação. A avaliação pretendida, sem dúvida, consolida o formato para o qual tem caminhado a aplicação dos grandes vestibulares - questões conceituais e contextualizadas. A única restrição que faço é a de não haver questões discursivas. Isso pode ser compensado usando-se o ENEM como prova de primeira fase das faculdades.

A pretensão da proposta é grande. Ela permitiria aos estudantes concorrer a qualquer vaga em universidades federais do país. E, certamente, estudantes de outros estados concorreriam às vagas do Rio de Janeiro. Entretanto, considerando apenas uma carreira, Medicina, que aqui tem alta concorrência, o movimento maior seria do Rio de Janeiro para fora - apenas por uma simples questão aritmética.

A prova deixará de exigir dos alunos quantidades colossais de informação para priorizar o raciocínio e a capacidade de solucionar problemas em quatro áreas do conhecimento. As linhas mestras já estão dadas, como explica Reynaldo Fernandes, presidente do Inep, órgão do ministério responsável pelo exame: “A prova ficará no meio do caminho entre o excesso de informações cobradas no vestibular e o pouco conteúdo do antigo Enem. Testará mais a capacidade de solucionar problemas da vida real do que o conhecimento acumulado”.


Uma possível conclusão crítica

O vestibular nada mais faz do que classificar os candidatos pelo seu conhecimento. Se a prova for fácil, difícil, discursiva ou de múltipla escolha, não terá muita importância, pois a concorrência é que tornará difícil a entrada. Sobrando vagas, todos vão entrar.

No fundo, o grande lema é um só: as sociedades modernas premiam cada vez mais a qualidade da educação recebida, tornando mais competitiva a entrada no Curso Superior e requerendo mais esforço dos alunos que disputam vagas nas melhores faculdades.

É necessário relembrar, porém, que nem tudo são desenhos e lápis de cor. Há uma série de questões e fatores políticos envolvidos na escolha entre um modelo e outro. No entanto, na atual conjuntura mundial (não apenas nacional), qual processo não apresenta pilares políticos, econômicos ou sociais?

Ademais, o aluno que estava preparado para o antigo modelo, também estará para o novo. O conteúdo programático vai permanecer basicamente o mesmo, nenhuma grande nova matéria vai ser adicionada às questões. Portanto, é apenas uma nova maneira de aplicar tudo aquilo que foi estudado e compreendido, ao longo das aulas e provas.

Há de se frisar, enfim, que há tempo para adaptação ao novo modelo e que não há melhorias ou novos defeitos. Há, na verdade, diferenças entre os modelos. As novas vidas são baseadas em mudanças, muito mais frequentes do que, por vezes, podemos notar. Essa é mais uma, que devemos entender e a que devemos nos adaptar. Ao clichê “vivendo e aprendendo”, podemos adicionar, então, um vivendo, se adequando e, assim, aprendendo.
Rui Alves Gomes de Sá

5 comentários:

Filipe disse...

Meu amigo,

Vida longa ao "Blog do Rui"! Que essa ferramenta seja mais uma daquelas que você, com brilhantismo, sempre usa para ajudar a construir uma sociedade mais justa e mais crítica.

Um grande abraço!

Anônimo disse...

Que beleza, Rui. Achamos que este é o caminho, parabéns pela iniciativa.

Beijos
Claudio Falcão e Rogério Athayde

Katyara disse...

Faço minhas as palavras do Couto. Vida longa ao Blogue do Rui! De tudo, não posso dar qualquer conselho ou tais e quais ideias: mas posso palpitar, como sim, e dizer que o lido, até já, está realmente muito bom. E fico deveras feliz com isso.

Abraços fortes!

Diego Moreira disse...

Legal, Rui!

Wellington Campos disse...

Olá, meu caro.

Cheguei aqui pelo blog do Diego e fiquei feliz em ver o conteúdo.

Com relação ao post, os argumentos pró e contra o vestibular são sempre maiores dos que o própro exame, mas não podemos deixar de observar que a avaliação meritocrática é, ainda, a mais sensata. Quanto à forma dela, veremos que a proposta do MEC não trará mudanças substanciais.

Parabéns pelo blog!


Quanto às referências rubro-negras, prefiro evitar comentários neste momento.

Abraço;