14/12/2009

Rio-2016



A escolha da cidade do Rio de Janeiro para sede dos jogos olímpicos de 2016, em outubro deste ano, confirmou a conquista de uma posição de destaque que o Brasil vem obtendo no cenário internacional. Juntamente com a escolha do país para a sede da Copa do Mundo de Futebol de 2014, a nova conquista possui um forte caráter simbólico, na medida em que projeta uma possível concretização do sonho do “Brasil Potência” e o possível fim da condenação que se impôs ao seu povo – a de viver em um eterno “País do Futuro”.

Nota-se, na política internacional atual, uma certa tendência de abertura, de inclusão dos países do mundo periférico no palco das discussões fundamentais para a humanidade. O G-20, onde o Brasil é uma das lideranças mais importantes, substituiu o G-8 – que reunia apenas países centrais – como espaço para o debate de idéias em âmbito global. Projeta-se uma reforma do Conselho de Segurança da ONU na qual o Brasil parece ter vaga garantida como membro fixo. Junto à Rússia, Índia e China, o Brasil compõe o grupo BRIC, que reúne os principais países emergentes do planeta, aqueles que têm as melhores projeções de crescimento para o futuro próximo.

Essa abertura inclusiva tem se refletido nos principais eventos esportivos do planeta. Em 2008 os jogos olímpicos ocorreram na China. Em 2010 a Copa do Mundo será na África do Sul. E o Brasil atraiu a atenção internacional conquistando o direito de realizar a Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016, um intervalo de dois anos entre esses dois grandes eventos esportivos. Isso só ocorreu anteriormente com a antiga Alemanha Ocidental, que sediou os Jogos de Munique, em 1972, e a Copa do Mundo de 1974; e com os Estados Unidos, quando eles realizaram a Copa do Mundo de 1994 e os Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996.


Momentos como esse, em que os países se tornam o centro das atenções do mundo durante algumas semanas, costumam ser aproveitados por eles para exibir sua capacidade de organização e de realização. Trata-se de uma oportunidade para ir além. Para fazer algo que não só confirme o merecimento do prestígio revelado pela escolha bem como para fazer algo que impressione positivamente, que supere as mais elevadas expectativas.

No entanto, o desafio imposto pela escolha do Rio de Janeiro para sede dos Jogos Olímpicos de 2016, não abre margem para que o Brasil se perca em meio ao ufanismo fomentado pelas grandes conquistas. A experiência obtida nos Jogos Pan-Americanos de 2007, em que várias obras atrasaram, entrando em caráter de urgência – o que enfraquece o rigor das licitações de obras – nos mostra que há muito trabalho a ser feito para que os Jogos possam ser realizados a contento. Um exemplo: o Estádio Olímpico João Havelange – conhecido como Engenhão – com capacidade para 47 mil pessoas, orçado inicialmente em 60 milhões de reais, custou, no final, 380 milhões de reais.

O projeto que impressionou o Comitê Olímpico Internacional e resultou na escolha do Rio de Janeiro tende a deixar heranças positivas e negativas para o espaço interno da cidade do Rio de Janeiro. Ele baseia-se na construção, na adaptação e na modernização de equipamentos esportivos em quatro áreas especiais da cidade: a Barra da Tijuca, a Zona Sul, o Complexo do Maracanã e Deodoro, no subúrbio.

De maneira direta, podemos afirmar que essas estruturas serão herdadas pela cidade tornando o Rio de Janeiro uma cidade preparada para receber os mais diversos eventos esportivos em quase todas as modalidades após os jogos. O que poderá atrair pessoas; reforçar o turismo; e aumentar a circulação de capitais e a oferta de empregos temporários na cidade, além de outras vantagens. Há ainda a possibilidade de uso dessas estruturas pela população, o que daria um viés social positivo ao trabalho. Comparando com o “legado do Pan”, vemos o uso freqüente do Engenhão – estádio que foi arrendado pelo Clube Botafogo de Futebol e Regatas – mas vemos, também a subutilização do parque aquático Maria Lenk e do velódromo construído para receber as competições de ciclismo de pista e patinação de velocidade. Exemplos positivos e negativos herdados do Pan.


O projeto para os Jogos Rio 2016 prevê que aproximadamente 50% das competições serão realizadas na Barra da Tijuca, área que deverá receber o maior volume de investimentos. Vila Olímpica, centro de mídia, e novas instalações – além das que já existem no Complexo Esportivo Cidade dos Esportes, que fica no Autódromo Nelson Piquet – devem ser construídas na região da Barra. O conjunto de investimentos, da Barra e das outras áreas, deve produzir uma valorização ainda maior do que a que já existe no espaço urbano da cidade.

O preço dos imóveis, para construção, aluguel e venda, deve aumentar significativamente. Uma vantagem para quem obtém renda através dessas atividades e uma desvantagem para quem não tem moradia própria. Esse encarecimento tende a ampliar a segregação sócio-espacial na cidade. A parcela da população que possui menor renda deve ser “empurrada” pelos preços para as áreas mais baratas – que em geral são muito distantes dos centros e sub-centros dinâmicos onde há mais empregos. Para reduzir tempo e custos de deslocamento, muitos se submeterão às habitações sub-normais, ilegais, que no Rio de Janeiro se manifestam principalmente através da formação de favelas. Ou seja, os Jogos Olímpicos de 2016 podem contribuir para o surgimento de favelas na cidade, como reflexo da valorização do espaço e da restrição do acesso a esse espaço aos habitantes mais pobres.